Revista de Ciências Militares - Vol. II, N.º 2

Editorial

As Ciências Militares e as suas áreas nucleares – Estudo das Crises e dos Conflitos Armados; Operações Militares; Comportamento Humano em Contexto Militar e Técnicas e Tecnologias Militares – abordadas em contextos históricos, da actualidade e de prospetiva, estão bem presentes nesta edição.

Numa associação à atual evocação do seu I Centenário, a temática da presente Revista focaliza-se na Grande Guerra 1914-1918, através de cinco artigos científicos bilingues, onde são analisadas as seguintes temáticas: o impacto de opções políticas e militares adotadas (artigos «The mother of all wars» e «A Alemanha ensanguentada»); capacidades desenvolvidas em termos de doutrina e treino («A Doutrina e o Treino Militar na Primeira República»), material (Os Gases Químicos e a sua implicação no Corpo Expedicionário Português) e liderança e educação («O Perfil do Oficial do Serviço de Estado-Maior na Grande Guerra»).

A ligação ao presente é materializada, extra dossiê, com o artigo sobre «A Liga das Nações» e a sua evolução para a «Organização das Nações Unidas», efetuada por três autores brasileiros.

A perspectiva sobre uma das crises atuais com maior impacto na Europa – a da Ucrânia –, bem como as relativas às temáticas da «Segurança Nacional no complexo de Segurança Europeia» e da «Estratégia do Espaço, na vertente da Segurança e Defesa», constituem valiosos contributos, tanto para o aprofundamento da sua compreensão na atualidade, como apoio à aplicação desse conhecimento em desenvolvimentos subsequentes.

Esta edição inclui, ainda, cinco recensões de obras literárias que acentuam estes elos das Ciências Militares entre o passado, o presente e o futuro.

Deste modo, o Instituto de Estudos Superiores Militares pretende dar continuidade ao propósito de incremento da difusão do conhecimento em áreas de particular interesse para a Segurança e Defesa, para o qual se convocam os nossos leitores e investigadores.

Votos de uma frutuosa leitura.

TGEN Rui Manuel Xavier Fernandes Matias

Diretor do IESM

Artigos

A Mãe de Todas as Guerras. Consequências a Longo Prazo das Opções Estratégicas Aliadas no Teatro de Operações do Mediterrâneo na Primeira Guerra Mundial

Resumo

Este artigo é uma análise às implicações a longo prazo das opções aliadas relativas ao Teatro de Operações do Mediterrâneo durante a Primeira Guerra Mundial, desde as ações políticas e militares que confirmaram a entrada da Turquia na Guerra às decisões relativas à conduta das operações militares e as relações entre as potências aliadas e os atores locais de forma a analisar as implicações negativas da ausência de ponderação entre as necessidades militares imediatas e os objetivos políticos a longo prazo. Para esse efeito o artigo apresenta uma breve descrição analítica, organizada numa base geográfica, das principais operações e dos seus efeitos a longo prazo nas respetivas regiões, conduzindo a uma apreciação global do contributo da estratégia aliada para estabelecer as bases das narrativas nacionais e natureza do estado Turco, da evolução dos nacionalismos do Médio Oriente e do fundamentalismo islâmico.

 

Palavras-chave

Mediterrâneo, Médio Oriente, Nacionalismo árabe, Fundamentalismo Islâmico, Estratégia Aliada na Primeira Guerra Mundial.

Autor(es) (*)

Avatar Nuno Correia Neves
 871 | 570
A Doutrina e o Treino Militar na Primeira República: o Emprego de Forças Terrestres na Primeira Guerra Mundial

Resumo

A implantação da Primeira República em Portugal criou um ambiente de enorme instabilidade política e social, debilitando a maioria das instituições nacionais, incluindo o Exército. A República trouxe ao Exército uma das mais significativas reorganizações da sua história, provocando um impacto negativo na sua coesão e capacidade operacional, nas vésperas da participação na Primeira Guerra Mundial. A participação nesta guerra constituirse-ia para o Exército como um enorme teste às suas componentes: física, moral e conceptual, particularmente na sua doutrina. Concluímos que a doutrina do Corpo Expedicionário Português já integrava os ensinamentos da guerra, tendo sido aplicada nas operações realizadas na Flandres. Quanto ao treino, este foi na generalidade dos casos realizado de forma inadequada e manifestamente insuficiente. A experiência da participação na guerra terá contribuído para a evolução doutrinária, mas o fator preponderante desta evolução foi a evolução tecnológica. A guerra foi o catalisador do desenvolvimento tecnológico, mas foi o desenvolvimento tecnológico que condicionou de forma decisiva a modificação do pensamento doutrinário.

Palavras-chave

Primeira Guerra Mundial, Doutrina, Treino, Ofensiva, Defensiva.

Autor(es) (*)

Avatar Cláudio Luís da Silva Ferreira
 815 | 567
O Perfil do Oficial do Serviço de Estado-Maior na Grande Guerra

Resumo

Este texto pretende caraterizar o perfil do oficial do Serviço de Estado-Maior no período da Grande Guerra. O Serviço de Estado-Maior foi criado em 1899, sendo herdeiro do Corpo de Estado-Maior instituído em 1834. Até 1890 a formação dos oficiais deste Serviço ocorria nos moldes das restantes Armas do Exército, mas a partir de 1891 passou a ser um curso complementar, abrindo a todas as Armas do Exército. Os oficiais do Corpo de Estado-Maior eram possuidores de uma formação académica acima da média para a época, pelo que os capacitou para o desempenho de múltiplas funções, tanto militares como civis. Não era um grupo que se limitava a planear e gerir, também comandavam Companhias, Batalhões e Grupos, desempenhando missões de âmbito operacional. Desde a sua génese como Corpo de Estado-Maior, o Serviço de Estado-Maior, sempre desempenhou um importante papel no seio do Exército, incluindo nos momentos mais conturbados como o da Grande Guerra.

Palavras-chave

Estado-Maior, Grande Guerra, I Guerra Mundial, perfil sociográfico, Exército.

Autor(es) (*)

Avatar Fernando César de Oliveira Ribeiro
 829 | 563
A Classificação dos Gases Químicos e a sua Implicação no Corpo Expedicionário Português

Resumo

Em 22 de abril de 1915, os alemães atacaram as forças aliadas, no saliente de Ypres, fazendo uso de um gás asfixiante. Utilizaram cloro em quantidades nunca antes vistas no campo de batalha. O resultado foi catastrófico para as tropas aliadas que não estavam preparadas para se defenderem desta nova arma na frente de combate. O emprego de novos agentes químicos mais letais foi-se desenvolvendo ao longo do conflito. Os ingleses e os franceses foram classificando estes agentes químicos consoante os seus efeitos fisiológicos nas vítimas. Os alemães, por seu lado, foram agrupando os agentes químicos consoante os efeitos pretendidos no campo de batalha, tendo em atenção a duração dos seus efeitos e o seu poder letal. Esta divisão alemã foi devidamente incorporada na sua tática. A doutrina alemã foi-se desenvolvendo ao longo do conflito e o lançamento de compostos químicos pela artilharia alemã na fase de preparação do ataque passou a ser um procedimento no campo de batalha. O apoio de fogos da artilharia à suas tropas de assalto recorria ao emprego criterioso de granadas com químicos com vista a atingirem determinados efeitos nas linhas defensivas dos aliados. Esta doutrina foi amplamente usada nas ofensivas alemãs da primavera de 1918. O Corpo Expedicionário Português (CEP) foi vítima daquela tática de emprego de gases de guerra na Batalha de la Lys de abril de 1918. As tropas portuguesas estavam na Flandres desde 1917 mas tinham tido apenas pequenos combates antes da primavera de 1918. Utilizavam a doutrina dos britânicos relativamente à guerra química e tiveram de lidar com uma nova abordagem de emprego de agentes químicos no campo de batalha por parte dos alemães.

Palavras-chave

CEP; Guerra química; classificação dos agentes químicos; batalha de La Lys; Bruchmüller.

Autor(es) (*)

Avatar Leonel José Mendes Martins
 840 | 566
A Alemanha Ensanguentada de Aquilino Ribeiro: O Testemunho de um Autor Português Sobre o Desejo de Vingança Alemão Nascido de Versailles

Resumo

Este artigo pretende demonstrar através da obra Alemanha Ensanguentada de Aquilino Ribeiro (1885-1963) o modo como o Tratado de Versailles foi recebido pelos alemães logo após a Primeira Guerra Mundial. E coloca em evidência a possibilidade das imposições deste Tratado terem fomentado o desejo de vingança dos alemães e alimentado a vontade de desforra numa outra Guerra Mundial. Por outro lado, a oposição a Versailles parece ter sido também uma das razões para o surgimento da Geopolítica na Alemanha no período imediato à Grande Guerra, como aqui se procura salientar. Finalmente, destaca-se o papel do desenvolvimento da cultura e das relações de sentimento notado por Albert Einstein (1879-1955) e Sigmund Freud (1856-1939), em particular através do conhecimento de línguas estrangeiras, como forma de fomentar a Paz.

Palavras-chave

Alemanha Ensanguentada, Aquilino Ribeiro, Tratado de Versailles, Primeira Guerra Mundial, Guerra, Geopolítica.

Autor(es) (*)

Avatar Marisa Alexandra Santos Fernandes
 860 | 599
A Importância Estratégica do Espaço para a Segurança e Defesa

Resumo

O acesso e uso do Espaço, como um domínio comum, revelam-se fundamentais para a sociedade moderna e para as organizações com responsabilidades na área da segurança e defesa. Neste sentido importa, cada vez mais, estudar este Poder emergente e os contributos que ele já disponibiliza e que poderá ainda disponibilizar tendo em mente as suas valências duais (civis e militares). Este ensaio procurará mostrar como a North Atlantic Treaty Organization (NATO) e a União Europeia (UE) encaram estrategicamente o seu uso e a forma como dele pretendem tirar proveito. Para tal estudamos o enquadramento político e estratégico em que as iniciativas espaciais atualmente se desenvolvem e as lições já conhecidas relativas ao seu emprego, no sentido de identificar o que aproxima e afasta as duas organizações e que iniciativas podemos prospetivar relativamente à exploração sinérgica e eficiente destes recursos, em linha com as preocupações securitárias refletidas no conceito estratégico da NATO, na política comum de segurança e defesa da UE e na política espacial europeia.

Palavras-chave

Capacidades Espaciais, Espaço, Estratégia, Poder Espacial, Segurança e Defesa.

Autor(es) (*)

Avatar João Rui Ramos Nogueira
 740 | 511
Securitização e Gestão do Risco – Uma Abordagem Conceptual

Resumo

Numa base ontológica construtivista, este artigo articula, ao nível conceptual, a teoria de securitização com a vertente técnica da gestão de riscos securitários, advogando que os processos de securitização de ameaças devem ser conduzidos de forma instrumental, com base na intensidade e natureza dos riscos. Contudo, a interdependência securitária dos Estados europeus constrange o próprio processo de securitização ao nível nacional, sendo impossível dissociá-lo do contexto e do nível de análise do complexo de segurança europeu. A gestão dos riscos, ao permitir a diferenciação da sua intensidade e discriminação da sua natureza, possibilita a distinção entre aqueles que são intensivos e cujas ameaças eventualmente deverão ser securitizadas e aqueles que são riscos extensivos e cujas medidas de mitigação passarão por abordagens políticas de essência menos extrema. A securitização de ameaças nacionais deve, assim, ser implementada com base nestas premissas, mas olhando igualmente para a Europa, de forma a evitar a descontextualização da realidade de Portugal com a do restante complexo de segurança regional no qual se encontra inserido e cujos laços de interdependência securitário obrigam a ter em consideração.

Palavras-chave

Segurança nacional, securitização, Escola de Copenhaga, gestão do risco.

Autor(es) (*)

Avatar Carlos Alberto Lopes Ramos Batalha
 754 | 511
A Liga das Nações: considerações sobre a participação brasileira, êxitos e óbices da predecessora da Organização das Nações Unidas

Resumo

Com o fim da Primeira Guerra Mundial e a partir do décimo quarto dos catorze Célebres Pontos do presidente norte-americano Woodrow Wilson, que embasaram o armistício de 1918, surgiu a Liga das Nações. Tal entidade pretendia transformar o delineamento das relações internacionais construído até então e, desta forma, fomentar a paz mundial e acautelar a recorrência dos desentendimentos que promoveram a mortandade naquela recente contenda em solo europeu. Sua declaração foi subscrita por 44 países, dentre os quais não se incluem os Estados Unidos. Inserido no escopo dos estudos de conflitos e sistemas de segurança, esta pesquisa tem por objetivo apreciar em que medida foi participação brasileira na Liga, bem como a atuação da atividade política daquele organismo na resolução e arbitramento de disputas territoriais, seus êxitos e óbices. A abordagem ao tema foi interdisciplinar, sendo realizada sob a ótica do institucionalismo histórico, valendose de contribuições das áreas do saber da história militar, ciência política, ciências militares e relações internacionais. Verificou-se o processo evolutivo do organismo, a transformação da conjuntura global e a forma como as sociedades competiam no espaço internacional, que levaram a sua autodissolução, em 1946, e à transferência das responsabilidades para a recém-criada Organização das Nações Unidas.

Palavras-chave

Primeira Guerra Mundial, Liga das Nações, Organização das Nações Unidas.

Autor(es) (*)

Avatar Carlos Alberto Moutinho Vaz
Avatar Eduardo Xavier Ferreira Glaser Migon
Avatar Rafael Soares Pinheiro da Cunha
 776 | 527
UCRÂNIA: Crónica de uma crise anunciada

Resumo

Um ano depois da rebelião da Maidan, a Ucrânia está dividida e em guerra, o confronto entre as forças de Kiev e os separatistas pró-russos do Leste fez já mais de 4300 mortos, o futuro do país é uma incógnita. A crise ucraniana gerou a mais grave crise de sempre nas relações entre a Rússia e o Ocidente desde o colapso da URSS, em 1991 e a “guerra fria” assoma de novo nas primeiras páginas e nos discursos dos políticos. Nove anos depois da Revolução Laranja de 2004, a Ucrânia torna-se de novo o ponto mais crítico na disputa entre uma NATO em expansão a Leste e aos esforços de Moscovo para reafirmar a sua esfera de influência no espaço da defunta URSS. O acordo de associação entre a Ucrânia e a União Europeia, que esteve no centro do levantamento da Praça da Independência, foi finalmente assinado no início de setembro, mas a preço de importantes concessões à Rússia que adiam pelo menos por um ano a entrada em vigor das cláusulas comerciais do acordo. Com o conflito no leste da Ucrânia suspenso de um cessar-fogo incerto, multiplicam-se alertas para o risco de o confronto entre a Rússia e o Ocidente se estender à Moldávia e à Geórgia, dois candidatos à NATO e a braços com regiões separatistas apoiadas por Moscovo.

Palavras-chave

Crise, Guerra, Identidade, Construção da Nação, Confronto Rússia Ocidente, Expansão da NATO a Leste.

Autor(es) (*)

Avatar Carlos Santos Pereira
 754 | 513

(*) NOTA: A ordem alfabética de apresentação dos autores pode não corresponder à ordem formal que se encontra no artigo.