Cadernos do IUM N.º 51 - Estudos Estratégicos das Crises e dos Conflitos Armados

Editorial

A presente publicação, correspondente à sétima edição dedicada aos Estudos Estratégicos, resulta do trabalho de análise e investigação produzido pelos auditores do Curso de Estado-Maior Conjunto 2019/2020, e da coordenação pelos docentes da Área de Estudo das Crises e dos Conflitos Armados deste Instituto. 
O contexto em que a mesma se realiza releva a importância dos artigos de reflexão que dela fazem parte, em consonância, aliás, com as linhas de investigação prioritárias do IUM, na medida em que são analisadas as dialéticas entre os principais atores do Sistema Internacional (SI) e uma parte significativa das ameaças que afetam a segurança global, cujo cenário de pandemia de COVID19 veio acelerar e aprofundar. 
Os Estudos Estratégicos constituem um dos pilares fundamentais da docência deste Instituto sendo, consequentemente, um dos objetos de estudo principais de que se ocupam as Ciências Militares. O seu contributo para a compreensão da conflitualidade geral, e para o estudo da guerra, em particular, assumiu especial relevância durante todo o período pós Segunda Guerra Mundial. Porém, ao longo das últimas décadas, com o fim da Guerra Fria e em razão da alteração do contexto securitário e da afirmação de outras ciências sociais, que acabaram por assumir um maior protagonismo na procura de explicar a realidade social e a relação entre atores do SI, esta disciplina ficou, por ausência da comunidade académica, quase exclusivamente reservada ao contexto Universitário Militar. 
Tendo na sua base os princípios teóricos da Estratégia e nos estudos de segurança o seu enquadramento principal, os Estudos Estratégicos constituem um campo de conhecimento que se dedica ao estudo, de forma sistemática e aprofundada, do fenómeno da guerra e da aplicação do instrumento militar. Dada a sua natureza multidisciplinar, a análise destes fenómenos solicita o recurso a outras ciências sociais, em particular da história, da geopolítica e da ciência política, que procedem não apenas ao seu enquadramento temporal e concetual, mas também à sua necessária adaptação ao contexto internacional e às novas ameaças. 
Em resultado desta contextualização, passaram a incluir-se novas dimensões do espectro conflitual, em particular o espacial, o virtual e o informacional. Além disso, a aplicação do instrumento militar foi alargada a outras atividades, que passaram a ser muito para além da guerra e cobrindo um espetro mais alargado de ameaças. Desse modo, para além da participação na resposta às ameaças híbridas e às ciberameaças, verifica-se também o envolvimento das Forças Armadas e Forças de Segurança na Pandemia da COVID-19, exigindo assim uma intervenção Estudos Estratégicos das Crises e dos Conflitos Armados 2 diferenciada num ambiente multidomínio. 
Neste sentido, considero que esta publicação constitui uma demonstração da vitalidade do ensino superior universitário militar e da qualidade da sua investigação académica, demonstrada pela relevância dos temas tratados no âmbito do Curso de Estado-Maior Conjunto, que constitui a parte curricular do Mestrado em Ciências Militares – Segurança e Defesa (2.º Ciclo). 
Por último, felicitam-se os autores dos textos e os coordenadores da obra pelos seus relevantes contributos, relevando-se a qualidade das análises, que permite perceber parte dos numerosos desafios securitários que se apresentam, e sobretudo, identificar as circunstâncias em que o instrumento militar pode ser usado para fazer face às ameaças. Deseja-se que esta publicação contribua para um enriquecimento do leitor numa área de conhecimento primordial para as Ciências Militares.

 

Tenente-general José Augusto de Barros Ferreira
Comandante do Instituto Universitário Militar

Artigos

A Índia no Contexto Geopolítico Mundial

Resumo

O Médio-Oriente representa um pilar fundamental da política externa Indiana, particularmente enquanto sua primordial fonte de recursos energéticos, imprescindíveis para o crescimento sustentado, bem como para a edificação de capacidades militares, que permitam dirimir os riscos securitários externos, advenientes particularmente do Eixo Sino-Paquistanês. Também a forte diáspora do Subcontinente, presente na região, reforça os interesses indianos na mesma, concretamente na sua segurança. A crescente conflitualidade no Médio-Oriente, marcada por questões religiosas, mas também por fortes interesses estratégicos de Potências Externas, com o pináculo na recente morte do General Soleimani, que veio a resultar no exponenciar da atrição entre o Irão e os EUA, constitui-se um risco para a salvaguarda dos interesses indianos na “Ásia Ocidental”, bem como para o seu prestígio e relevância, enquanto potência regional de primeira linha, com estreitas relações bilaterais, transversais em todo o espetro do Médio-Oriente. Compreender como se posicionará a Índia face a esta recrudescente conflitualidade, optando pela atitude histórica que a carateriza de neutralidade e “não intervencionismo”, ou, por outro lado, adotando uma postura mais assertiva, designadamente como mediadora da mesma, será uma das mais relevantes questões geopolíticas da atualidade, centrando-se nela o presente trabalho. Através de uma investigação de tipo qualitativo, assente na pesquisa bibliográfica, constatou-se que a Índia, atento o seu pensamento estratégico e relações regionais, se posiciona como o principal ator do Sistema Internacional para mediar o conflito, assumindo um papel geopolítico cada vez mais relevante no Médio-Oriente.

Palavras-chave

Índia, Médio-Oriente, Neutralidade, Pensamento Estratégico, Conflitualidade, Diáspora, Recursos Energéticos.

Autor(es) (*)

Avatar António Marcelino da Silva
 243 | 74
A Geopolítica do Alargamento da UE: Riscos e Imperativos

Resumo

A génese da criação da União Europeia (UE) foi a tentativa de eliminação da guerra como alternativa para fazer face a conflitos que surgissem. O objetivo foi criar uma comunidade de Países em que a solução dos conflitos fosse pela via pacífica. Com o passar dos anos, foi verificado que esse objetivo foi alcançado, quer pelos membros como pelos não membros. Tornou-se apetecível para os Estados que estavam à sua volta quererem fazer parte da UE, aceitando a adoção dos valores e normativos europeus para conseguirem satisfazer as exigências impostas e conseguirem aderir a esta. Os alargamentos que foram ocorrendo ao longo da história da UE não foram apenas benéficos para os novos membros, mas também para a própria UE. Arrisca-se a referir que foram essenciais para a credibilização da União e que foi a política de alargamentos que permitiu o avanço da democracia, direitos humanos, paz e segurança na Europa. Contudo, com o grande alargamento ocorrido em 2004, começaram a existir alguns Estados-membro opositores a novos alargamentos antes da UE resolver os seus problemas internos. Por outro lado, os restantes Estados-membro defendiam que para o desenvolvimento da UE e a sua segurança, era imprescindível prosseguir-se o caminho que vinha a ser traçado. Atualmente, o alargamento a curto prazo passa pelos Países dos Balcãs Ocidentais (PBO), Países estes que atualmente se caraterizam pela instabilidade económica, política e sobretudo securitária. Tendo em vista as declarações recentes de que a UE deve alargar o mais brevemente possível, por necessidades geopolíticas, importa analisar os riscos e imperativos desse possível alargamento.

Palavras-chave

União Europeia, Países Balcãs Ocidentais, Alargamento, Riscos, Imperativos, Geopolítica.

Autor(es) (*)

Avatar Paulo Roberto Pires Silveiro
 244 | 84
Os EUA e o Irão. Opções de Resposta Militar

Resumo

O antagonismo entre os Estados Unidos da América e a República Islâmica do Irão é marcado por uma longa história de guerras de baixa intensidade, e remonta à criação da República Islâmica em 1979. Porém, sobretudo durante o último ano, tem-se assistido ao recrudescimento da conflitualidade entre as partes, o que tem levado os decisores políticos a considerar o recurso a todos os instrumentos de poder ao seus dispor, mesmo o militar, pelo que importa garantir que todas as Opções de Resposta Militar apresentadas possuem validade estratégica. Assim, e de modo abordar a temática apresentada, a metodologia utilizada assenta no raciocínio dedutivo, através de uma estratégia qualitativa, sendo a recolha de dados baseada na análise documental e pesquisa bibliográfica. Concluiu-se que apenas as Opções de Resposta Militar menos cinéticas possuem validade estratégica (adequabilidade, aceitabilidade, exequibilidade), sendo que o desenvolvimento de táticas de guerra assimétrica por parte do Irão é o fator que mais contribui para a reprovação das Opções de Resposta Militar no filtro das provas da estratégia.

Palavras-chave

Irão, Médio Oriente, Estados Unidos da América, Opções de Resposta Militar, Validade Estratégica.

Autor(es) (*)

Avatar Orlando Filipe Abelha de Garcia Pereira Libório
 244 | 74
Alterações Climáticas: Ameaça para a Balança de Poder na Região da Ásia-Pacífico

Resumo

A região da Ásia-Pacífico tem vindo a afirmar-se globalmente pelo seu rápido crescimento económico, mas também tem contribuído de sobremaneira para o aquecimento global e o aumento de emissões de gases com efeito de estufa no planeta. Neste contexto, o objetivo do presente artigo centrou-se em efetuar uma análise às alterações climáticas, e o impacto que daí advém, nomeadamente no desenvolvimento de poder nesta região, que se tem verificado ao longo das últimas décadas. Para concretizar o objetivo de estudo, foi seguido um método de pesquisa científico, que teve como base a recolha de dados e a sua interpretação, procurando construir um raciocínio dedutivo, a partir dos factos e evidências obtidas pela análise documental. Verificou-se que a ação do homem tem provocado alterações climáticas que têm projetado diversos fenómenos catastróficos, com grande ocorrência na Ásia-Pacífico, provocando um desequilíbrio na natureza, mas também nas próprias populações desta região. Neste contexto, conclui-se que a disputa pelos mercados mundiais, com a China a assumir um papel de destaque, tem grandes implicações ao nível de elevados gastos energéticos e produção de gases com efeito de estufa nesta região, fazendo com que este país possa vir a tornar-se a maior vítima das suas próprias ambições.

Palavras-chave

Alterações Climáticas, Aquecimento Global, Ásia-Pacífico, Gases com Efeito de Estufa.

Autor(es) (*)

Avatar José Manuel Costa da Silva Barradas
 261 | 87
Os Nacionalismos e a Violência

Resumo

Este estudo tem como principal finalidade identificar os principais desafios securitários decorrentes do reforço dos nacionalismos. Para tal, recorreu-se a ao estudo dos fatores que contribuíram para a formação da Jugoslávia e seu desmembramento tendo como objeto de estudo os nacionalismos étnicos. Apesar de vários autores afirmarem que os conceitos de nacionalismo e violência não têm uma relação dependente, no caso da Jugoslávia, devido a motivações étnicas, a violência caminhou ao lado do nacionalismo, tanto na ótica da sua unificação dos reinos eslavos do sul como no desmembramento da Jugoslávia originado guerras civis e conflitos étnicos de extrema violência nos países cujas fronteiras administrativas não coincidentes com as fronteiras étnicas e culturais, como é caso da Bósnia-Herzegovina. Apesar do esforço da comunidade internacional para a contenção dos conflitos étnicos, os interesses dos diversos atores internacionais contribuíram para a destabilização do ambiente de segurança que tem sido constantemente desenvolvido, emancipando os nacionalismos étnicos latentes, colocando desafios securitários decorrente deste fenómeno.

Palavras-chave

Nacionalismo Étnico, Jugoslávia, Conflitos Étnicos, Independência.

Autor(es) (*)

Avatar Nelson Miguel Gonçalves Ferreira
 247 | 78
As Organizações Criminosas na Crise das Migrações: Desafios Securitários para a Europa

Resumo

O presente trabalho tem como objetivo analisar os desafios securitários decorrentes dos movimentos secundários de migrantes na União Europeia, resultado da crise das migrações que tem assolado a Europa na última década, e sua exposição a organizações criminosas. Após contextualização da temática, abordaram-se os movimentos secundários no contexto das migrações, aludindo aos mecanismos de coordenação e instrumentos operacionais disponíveis para os tentar conter, bem como as ameaças e implicações securitárias para a União Europeia. O fenómeno dos movimentos secundários de migrantes tem evidenciado uma tendência crescente ao longo dos últimos anos, situação que se revelou uma oportunidade para as organizações criminosas que exploram a fragilidade desta população que, na procura de melhores condições de vida junto das suas comunidades, têm procurado diferentes países daqueles que são determinados pelas normas do Regulamento de Dublin, o que os coloca numa situação irregular. Concluiu-se que a União Europeia enfrenta assim um conjunto de desafios securitários diversificado, quer ao nível da segurança comum, quer ao nível da segurança humana, que urge solucionar, recorrendo para tal a mecanismos como a EUROPOL, a EUROJUST e a FRONTEX, que se pretendem cada vez mais reforçados mas, fundamentalmente, que os Estados-Membros cumpram rigorosamente as políticas de asilo da União Europeia, possibilitando assim uma melhor coordenação neste âmbito.

Palavras-chave

Movimentos Secundários de Migrantes, Organizações Criminosas, União Europeia.

Autor(es) (*)

Avatar Ana Patrícia Cardoso Lopes
 264 | 81
A Computação Quântica e a Guerra Futura

Resumo

O objeto de estudo deste artigo centra-se nas capacidades que a Computação Quântica pode disponibilizar e enfrentar em contexto militar, correlacionando estes efeitos com a caracterização de guerras futuras. A metodologia de investigação adotada assenta numa estratégia qualitativa e em um desenho de pesquisa comparativo entre os atores mais relevantes na cena internacional, baseado em análise documental de entidades estatais e de instituições da área de estudos que versam sobre essa área. A computação quântica tem desenvolvido capacidades consideradas disruptivas que previsivelmente e potencialmente alterarão o balanço de poder, pois se por um lado se constituem como uma capacidade, por outro lado essa capacidade posta-se como uma ameaça quando observada pelo flanco oposto.

Palavras-chave

Computação Quântica, Distribuição De Chaves Quânticas, Criptoanálise Quântica, Deteção Quântica.

Autor(es) (*)

Avatar Tiago Filipe Abreu Moura Guedes
 234 | 75
As Armas Hipersónicas e a Guerra Futura

Resumo

O objetivo desta investigação é analisar o impacto conferido pelas armas hipersónicas na guerra e na conflitualidade futura, recorrendo a um estudo de caso comparativo entre os programas de desenvolvimento tecnológico destes novos sistemas, por parte dos Estados Unidos da América, da Federação Russa e da China. A presença destas armas nos arsenais das principais potências mundiais terá reflexos, tanto nas relações entre elas, como no desenrolar dos conflitos futuros. Assim, torna-se necessário um entendimento tripartido que, por um lado, regule o desenvolvimento e o emprego desta tecnologia, associada à sua capacidade nuclear, assim como, vede o seu acesso a atores que possam fazer destas armas um uso indesejado. Pese embora o facto de serem necessárias medidas de controlo para o seu emprego, constata-se que esta capacidade, per se, não terá um papel determinante num futuro, que se prevê marcado pela subversão e pela luta pelo domínio da informação.

Palavras-chave

Armas hipersónicas, Estados Unidos da América, Federação Russa, China, Tecnologia, Mísseis.

Autor(es) (*)

Avatar Júlio Alexandre Couto Carilho
 241 | 75

(*) NOTA: A ordem alfabética de apresentação dos autores pode não corresponder à ordem formal que se encontra no artigo.